Cena.com Partilha recebe Cia. São Jorge de Variedades com "Quem não sabe mais quem é (...)"

Vencedora do Prêmio Shell por este ousado processo de criação, a Cia. São Jorge de Variedades chega a Guarulhos com sua encenação sobre Heiner Müller. Quem não sabe mais quem é, o que é e onde está, precisa se mexer é fusão da dramaturgia alemã com a linguagem da companhia. A atividade compõe a programação Cena.com Partilha, da Secretaria de Cultura, que objetiva promover partilhas de processos criativos por meio de espetáculos e atividades formativas diversas. 

O espetáculo, que será encenado nos dias 29 e 30 de novembro, sábado às 16h e 20h30 e domingo às 20h30, no Teatro Adamastor, apresenta quatro quadros dos movimentos de três cidadãos engajados nos desejos de revolução. Estão no elenco o ator Marcelo Reis e as atrizes Patrícia Gifford e Paula Mirhan. A direção é de Georgette Fadel.

Antes, nos dias 27 e 28, a companhia ministrará o workshop O ator e seu manifestoAção, no qual partilhará exercícios de seu vocabulário comum, que vêm sendo sedimentados ao longo dos últimos quinze anos: A busca de um ator sensível a partir da tomada de consciência da coluna vertebral, pela prática da massagem; a busca de um corpo coletivo a partir de exercícios de coro; e o estabelecimento do jogo cênico, por meio do jogo de bambu. Os encontros acontecerão quinta e sexta, às 19h, no CME Adamstor e os interessados poderão se inscrever até dia 25, através do preenchimento de formulário eletrônico disponível em www.formacaocultural.blogspot.com.br.

O projeto é contemplado pelo ProAC e conta com o apoio local da Secretaria de Cultura de Guarulhos.

As raízes deste projeto

Três atores saem, sem grande alarde, de pontos diferentes da cidade, cada um com uma proposta diferente e discreta de revolução. Enquanto caminham, chamando o público para o teatro, nas ruas são estendidas faixas com frases como “Quem não se mexe, não sente as grades que o aprisionam”. Os atores levam o público para o cenário de um pequeno apartamento. Lá se desenrola a encenação da São Jorge sobre a obra de Heiner Müller - a peça Quem não sabe mais quem é (...), que recebeu críticas favoráveis de todos os grandes jornais de São Paulo. 

O espetáculo ganhou forma a partir da pesquisa e improvisação sobre o universo de Heiner Müller. As peças do autor alemão, suas entrevistas e a intensidade de seu discurso são elementos que dão o tom ao espetáculo. 

A pesquisa do projeto Intervenção Permanente (2009), contemplada pela Lei de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo, durou 10 meses, e foi a oportunidade da São Jorge dar uma reviravolta também em sua forma de encenação. Acostumada a trabalhar com elencos grandes, foi a primeira vez que a trupe se apresentou com apenas três atores (Marcelo Reis, Mariana Senne e Patrícia Gifford). 

Em pouco mais de uma hora de peça, o discurso de Heiner Müller é todo transformado em situações muito próximas do público. A verve do dramaturgo também vira música. Literalmente. A direção musical de Luiz Gayotto transforma algumas partes densas dos textos em imagens sonoras. 

Para Georgette Fadel, a poesia de Müller encantou todos os integrantes. “A Mariana Senne foi quem nos apresentou o autor quando trouxe a obra Quarteto. A simpatia foi imediata, principalmente por ele ser considerado o herdeiro e interlocutor de Brecht, por quem somos apaixonados”, conta a diretora. 

A partir disso, a Cia organizou uma "roda de prosa", com convidados como: Celso Frateschi, Iná Camargo Costa, José Fernando de Azevedo, Sérgio de Carvalho e o Grupo Oi Nóis Aqui Traveiz, entre outros para discutir a obra e estéticas de encenações de Heiner Müller.

Em seguida, os atores começaram a criar algumas improvisações sobre o universo do autor, que resultaram no espetáculo que após três temporadas paulistas, realizou circulação pelo Brasil com o Prêmio Myriam Muniz (2011) e no programa de Ocupação dos Teatros da Caixa Cultural (2011). Agora, em 2014, entra novamente em cartaz nas cidades de Ilha Bela, Santos, São Carlos, Marília e Guarulhos, pelo Proac Circulação.

Intervenção Permanente

A ação de Quem não sabe mais quem é (...) começa nas ruas da cidade onde os três atores se encontram e levam o público até o espaço de apresentação, onde está montada a lúdica e bem elaborada cenografia de Rogério Tarifa, um apartamento, ou melhor, um “aparelho”. “Nossos personagens são verdadeiros revolucionários, que às vezes parecem cômicos, patéticos e até mesmo loucos ou muito lúcidos”, diz Georgette Fadel.

Entre os textos A Missão e Hamlet Machine e entrevistas com Heiner Müller selecionados para o espetáculo, os atores também garimparam alguns outros autores dando mais força ao texto. Rosa Luxemburgo, Juliano Garcia Peçanha e o roteiro do longa-metragem O Bandido da Luz Vermelha são alguns exemplos que se mesclam com textos dos próprios atores. 

"Os textos de Müller recontam a história de personagens teatrais arquétipos como Hamlet e Medeia. Buscamos criar, de maneira metafórica, num apartamento, nossos mecanismos cotidianos, seus aspectos positivos e negativos e tentamos revelar alguns mitos e forças que permeiam nossa rebeldia, tédio e esperança de um mundo melhor", completa Georgette Fadel. 

Nos últimos dez anos a Cia São Jorge de Variedades vem fazendo encenações e incursões em lugares alternativos: como albergues e a própria rua, absorvendo os personagens do local em suas encenações. Agora, é a vez do mais polêmico dramaturgo da pós-modernidade, o alemão Heiner Müller, ser o centro da pesquisa da São Jorge.

Müller é considerado o herdeiro de Antonin Artaud e Bertolt Brecht. Brilhante encenador de suas próprias peças e de uma genialidade que o levou a reescrever as histórias de Hamlet, Medéia e dos heróis de Brecht; com uma linguagem contemporânea que assusta; e com a preocupação performática com o uso do corpo. 

"Heiner Müller é complexo, mas colocado sob olhar simples, com jogo cênico, torna-se inteligível", diz a diretora, que já fez pesquisas similares com textos de Qorpo Santo e Stela do Patrocínio. 

“Heiner Müller coloca nos textos o amargo de revoluções como o marxismo, o idealismo francês ou a luta de classes, explicitando a complexidade de nossos vícios e o contemporâneo de nossas frustrações, em textos muitas vezes jogados ao público como uma metralhadora.” 

Georgette continua: “Sabemos que a revolução não foi fracassada e sim reprimida! Rosa Luxemburgo, por exemplo, foi brutalmente assassinada e jogada em um rio. Nossa geração, ou parte dela, cresceu ouvindo falar do fracasso da Revolução, o fracasso do sonho, alimentada pelas idéias de inutilidade e incapacidade de se lutar por algo, aliada a falta de sentido da vida. Fizeram-nos acreditar nisso e grande parte de nossos dias passamos tentando recuperar a certeza de que somos fortes e as coisas podem ser e serão transformadas. Nessa nova montagem a São Jorge se coloca dentro de um apartamento e pinta então, com lentes de aumento, o auto-retrato bem humorado, mas cruel. Temos energia, vontade e clareza, mas estamos deslocados do centro da ação, presos nos muitos apartamentos. Do jeito certo, mas na hora errada e na hora certa, porém no lugar errado.”

Sobre Heiner Müller

Com diversos eventos espalhados pelo mundo, a comemoração dos 80 anos de nascimento de Heiner Müller promete muitas homenagens. Nascido em Eppendorf, Saxônia, em 1929, o dramaturgo, poeta e diretor de teatro, embora tenha papel na história do teatro como a continuidade da modernidade idealizada por Baudelaire, Kant, Artaud e Brecht, teve sua marca e rebeldia particulares. Estréia O Achatador de Salários, em Leipzig, em 1957. Trabalha no Teatro Maxim Gorki em 1958-59. Estréia de A Repatriada,em Berlim, em 1961, a seguir sofre a proibição da peça e é excluído da Associação dos Escritores. Trabalha no Berliner Ensemble e, a partir de 1976, na Volksbühne. 

Em 1990 é eleito presidente da Academia das Artes em Berlim Oriental, e a partir de 1992 assume a superintendência do Berliner Ensemble. Recebe o Prêmio Heinrich Mann em 1959 com Inge Müller, prêmio de Dramaturgia de Müllheim em 1979, prêmio Georg Büchner em 1985, Prêmio Nacional da RDA em 1986, Prêmio Kleist em 1990, Prêmio Europa de Dramaturgia em 1995. Falece em 30 de dezembro de 1995.

Serviço

Quem não sabe mais quem é, o que é e onde está, precisa se mexer

Cia. São Jorge de Variedades

Drama

Duração: 120 minutos

Classificação: 16 anos

Dias 29 e 30/11 - sábado, às 16h e 20h30 / domingo, às 20h30

Entrada Franca - retirar ingressos com uma hora de antecedência

Espetáculo processional - Público limitado a 60 pessoas por sessão.

Workshop O ator e seu manifestoAção

Cia. São Jorge de Variedades

Público-alvo: atrizes e atores com idade superior a 16 anos.

Dias 27 e 28/11 - quinta e sexta, das 19h às 23h

Inscrições até dia 25 por meio de preenchimento de formulário eletrônico.

Para ser redirecionado ao formulário de inscrições clique aqui

Teatro Adamastor - Avenida Monteiro Lobato, 734, Macedo, Guarulhos.

Informações: formacaocultural.guarulhos@gmail.com | 20874175